Pular para o conteúdo principal

Por um e único imposto

A ciência por trás do financiamento do gasto público não recai sobre a capacidade de maximizar a receita, ou, de outra forma, de conseguir financiar os gastos desprendidos. Se assim fosse, o Governo, enquanto instituição seria um agiota que manipula a sociedade para que lhe dê cada vez mais poderes sobre a mesma. Afinal de contas, quem controla a renda, controla grande parte da sociedade.

A minha última afirmação não é injustificada. Além do mais, hoje podemos perceber os malefícios de ter um Governo que dispõe de quase toda a renda de uma sociedade. Veja o caso de cidades como Macaé e Itaboraí, ambas extremamente dependentes de receitas provenientes da estatal Petrobrás. Como a receita estava concentrada em um único ator, bastou o esgotamento e a ingerência da petroleira para assolar as duas cidades, gerando uma tremenda perda de bem-estar para suas populações.

Em escala nacional, tal configuração é perniciosa, e cresce na medida em que se depende cada vez mais de um Governo que vai se tornando ineficiente. Defendo, então, aqui a tese de que um Governo possui deseconomias de escala, bem como qualquer administração que se paute pela política enquanto cerne da tomada de decisão. A explicação é simples, são muitas vozes a serem ouvidas, em um momento da história em que a decisão ótima precisa, ser entre outras coisas, rápida.

Sobre o financiamento do gasto público, então, recai uma responsabilidade enorme, e, sobretudo democrática. Não há algo mais pernicioso para a democracia do que impostos que funcionam no sentido contrário dos preceitos democráticos, e, que também, fogem das funções típicas das políticas públicas: alocativa, redistributiva e estabilizadora. E hoje temos um quadro de que grande parte dos instrumentos fiscais são uma antítese da boa política e dos princípios que deveriam lhe guiar.

Refletindo sobre a questão, e, também, sobre o empoderamento que tal faculdade (cobrar impostos) gera ao Governo e para o setor responsável (Receita Federal), vejo que a situação atual beira o caos. Não se tem um verdadeiro controle do que é feito, e, graças a discricionariedade concedida tanto a quem cria os impostos quanto a quem os executa. Logo, a discussão sempre orbita o tópico novos impostos, mas se esquece do método e de controlar a eficiência e eficácia de quem os executa.

Pensando nos três princípios básicos, um imposto que se adequaria a esta finalidade não poderia residir sobre o consumo. Fazia sentido ser assim no passado. Uma vez que as pessoas podem esconder sua riqueza, mas não podem se abster de consumir. Logo o Governo conseguia mensurar quem tinha a maior capacidade de contribuir para a "sociedade", simplesmente observando quem consumia mais. Contudo, esse imposto está longe de ser infalível, e mais, possui a característica de ser regressivo, ou seja, pesa mais em quem menos tem.

Sendo dessa forma, dadas as peculiaridades da economia dos tempos atuais, onde as trocas acontecem muitas das vezes sem envolver dinheiro físico, e que, a grande maioria dos agentes possui contas em bancos, as quais são movimentadas através de cartões magnéticos, conectados diretamente as suas contas, permitindo a rápida troca de bens e serviços, fica quase impossível viver nessa economia sem uma conta bancária. E mais, fica ainda difícil se abster de movimentá-la, sob pena de não possuir o mínimo para se manter durante um dia, semana ou mês.

Além disso, as pessoas cada vez mais dependem de contas bancárias para receberem seus salários, receitas de vendas de bens e serviços, doações, entre outros. É simples estar na informalidade, mas não é simples viver hoje sem uma conta bancária. Logo, um imposto que geraria pouca distorção na economia seria um que captasse a capacidade de pagar impostos através da movimentação financeira dos indivíduos. 

Logo, por que não utilizar a movimentação financeira para financiar os gastos públicos de maneira automática, e acabando com quase todo o empoderamento da Receita Federal, bem como do Governo para criar novos impostos? Seria simples se houvesse apenas um único imposto, que seria uma proporção do quanto você movimentou. Além disso, se o indivíduo depende de movimentação para gerar receita, como um varejista, este poderia pagar impostos de maneira reduzida. O imposto deveria ser uma proporção do quanto entra e sai de sua conta. Mas iria crescendo na medida que os valores também iriam crescendo. Quanto menos regras para o imposto melhor, mais eficiente ele se torna, e mais justo também.


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A regra do 69

Uma pergunta simples ronda os mais curiosos sobre investimentos: quanto tempo demorará para que eu dobre meu capital investido. Ou seja, se eu coloco 100 reais hoje, ou um múltiplo, quanto tempo terei que esperar para meu capital dobrar? Alguns textos mostram de forma rápida a chamada regra do 72, que significa simplesmente que o tempo será T=72/taxa, ou seja, suponha que a sua taxa de juros real hoje seja de 14.15% ao ano (selic), por essa regra, o tempo que você irá demorar para dobrar seu capital é de 72/14.15, que é igual a 4,96 anos. Mas como chega-se a esse resultado? A conta é simples, e está indicada abaixo. Porém a regra não é do 72, é do 69... Portanto, tem-se uma regra bastante prática para calcular um valor bastante intuitivo. O quanto eu preciso esperar para que meu capital dobre, a uma dada taxa de juros. Felizmente, no Brasil vivemos um regime de taxa de juros elevada, porém, geralmente a conta é contrária: "quanto tempo devo esperar para que a

Como combater a inflação inercial (indexação)

O indexação é uma forma de proteger sua reserva de valor. Um jeito de poder manter constante o rendimento de uma operação. Principalmente quando esta envolve troca de valores futuros, que, por conta da inflação, correm o risco de se deteriorarem rapidamente, conforme os meses e os anos passarem. A compra de bens de consumo duráveis e imóveis envolve, entre outras coisas, acordos de antecipação de receita para o lado do comprador, e postergação para o lado do vendedor. Para se protegerem da desvalorização da moeda (inflação) os agentes do lado da venda necessitam de instrumentos que lhe permitam atualizar o valor monetário dos fluxos de caixa futuros. Com isso a indexação se faz extremamente útil, pois sem ela, ninguém iria querer vender à prestação. Porém, uma compra indexada gera, também, incertezas para o lado do comprador, uma vez que, ele não tem condições de, a priori, conhecer qual será a taxa que irá vigorar para a correção de suas prestações. Gerando com isso um desco

O elefante e o circo e os investimentos em educação

Para cada 1 real investido, se tem como retorno R$ 4,88. Talvez uma das tarefas mais dispendiosas de um dono de circo seja treinar um elefante. O animal é extremamente forte, pesado (óbvio), come muito e difícil de lidar. Contudo, quase todo circo possui um elefante em seus números de adestramento. O porquê não é difícil de entender. O animal vive mais de 70 anos, e possui a maior memória entre os mamíferos terrestres. Portanto, a pesar do elevado custo de ensiná-lo, e de alimento e etc, o investimento inicial uma vez sendo implementado, o paquidérmico renderá 70 anos de shows impecáveis. A comparação pode parecer esdrúxula para alguns, mas o mesmo acontece ao ser humano, principalmente na primeira infância. A nossa capacidade de aprendizado é muito grande entre 2 e 5 anos, e podemos ter nossas habilidades cognitivias e socioemocionais impactadas de maneira bastante significativa. Obviamente não se faz mister que todas as crianças tenham pré-escola, mas o estimulo diário ao co

Marcadores