Pessoal, conheci esses dois rapazes que resolveram empreender no ramo alimentício, fornecendo almoço a preços módicos dentro da UERJ. Conhecendo a estrutura deficiente pela qual hoje a oferta de comida aos estudantes acontece, com filas de no mínimo 30 minutos e preços por refeição de 11 reais (a diferença quem paga é o orçamento do Estado meus caros), resolvi entrevistar os caras para saber melhor sobre seu projeto e também buscar novas formas de repensar a atuação pública em demandas sensíveis aos mais fragilizados.
Sem dúvida a garantia alimentar é condição necessária para que o investimento da universidade seja eficiente, afinal, ninguém aprende com fome. Mas será que um bandejão é a melhor opção?
Segue a entrevista:
Sem dúvida a garantia alimentar é condição necessária para que o investimento da universidade seja eficiente, afinal, ninguém aprende com fome. Mas será que um bandejão é a melhor opção?
Segue a entrevista:
Primeiramente gostaria que vocês escrevessem para mim o perfil de vocês,
ou seja, nome, profissão, onde moram, estudam, como e quando conheceram a UERJ,
qual sua relação com a universidade e qual sua percepção de hoje da mesma.
Chamo-me Bruno
Strzoda Ambrósio, moro no bairro de Irajá com minha mãe, avó e irmã, curso
engenharia elétrica na UERJ (sexto período) e conheci a mesma durante o período
de vestibular.
Minha concepção
atual é que a UERJ passa pela maior crise de sua existência, englobando diversos
setores, desde alunos e professores a técnicos administrativos e terceirizados.
Meu nome é Max
Santiago de Macedo Barcellos, também moro em Irajá, com minha mãe e irmã.
Possuo ensino médio completo e trabalho com projetos pessoais relacionados à
música. Conheci esta universidade através do Bruno há uns 4 anos e hoje sou
frequentador assíduo dela.
Acredito muito no
potencial da UERJ, mas vejo que hoje ela não é valorizada nem representada da
forma como deveria ser.
Após, respondam as seguintes perguntas para mim:
1- O que te levou a abrir ou começar o negócio ForaFome?
Primeiramente a
necessidade. Em tempos de crise, como o que vivemos, buscamos alternativas para
sobreviver. Numa conversa com um amigo de infância, ele dizendo que abriu uma
cozinha industrial e servia regiões próximas a Irajá, como por exemplo, o
Ceasa, surgiu a ideia de levar essas refeições à UERJ e unir o útil ao
agradável: levantar um dinheiro que fosse capaz de suprir minhas necessidades
básicas e, em contrapartida, fornecer uma alimentação de qualidade e num preço
acessível para a comunidade UERJiana.
Por que a UERJ e
não qualquer outro ponto no Rio de Janeiro? Simples! Como estudo nela e tenho
aulas durante a tarde e a noite, seria bem prático e favorável executar esse
serviço neste local.
2- Quando começou o negócio? Qual foi a reação de seus familiares e
amigos? Qual a recepção que você percebeu entre seus conhecidos na UERJ?
Tudo começou de
fato no dia 14 de Setembro deste ano, numa quarta-feira. Foi quando trouxe
minha primeira remessa de quentinhas. Por um acaso, na manhã deste dia eu e Max
estávamos juntos. Ele se ofereceu para me ajudar com as entregas e eu aceitei
no ato! Deste dia em diante percebi que a ajuda dele para mim seria
fundamental. Aí então surgiu a atual sociedade.
Minha família num
primeiro momento reagiu com surpresa e um pouco de incredibilidade à minha
decisão. Principalmente por eu ter que usar o ‘carro da família’ diariamente
para realizar as entregas. Conforme o tempo foi passando e elas repararam na
seriedade do trabalho e no quanto estava dando certo, o cenário mudou e tudo
está correndo tranquilamente hoje em dia.
Já com a família do
Max a reação foi de aprovação desde o começo. Uma vez que, segundo sua mãe, um
trabalho como esse o tiraria da inércia e abriria os olhos de seu filho para
novos horizontes.
Os amigos de bairro
não deram muita importância à novidade. Já os amigos da UERJ ficaram surpresos,
felizes e apoiaram desde o início. Sempre incentivando e dando ideias para
melhorar e aperfeiçoar as etapas do processo de entrega das quentinhas.
Quanto aos demais
alunos próximos, senti uma espécie de respiração libertária, como quem pensa
“Ufa, mais uma opção e dessa vez mais acessível e barata para se almoçar na
UERJ”
3- Fale um pouco sobre a logística do seu negócio, sem entrar em
detalhes sigilosos, explica para mim como ele funciona.
O negócio funciona
de uma forma relativamente simples, porém, trabalhosa. Eu e Max chegamos à
cozinha diariamente em torno das 9h da manhã e ajudamos na preparação das
quentinhas. Eu escrevo os pedidos antecipados nas tampas de isopor e o Max
supervisiona as quentinhas prontas para ver se não está faltando algum item que
deveria ter ou qualquer outro possível erro e, também embala as mesmas.
Feito isso,
organizamos os pedidos separadamente nas formas de isopor (cada uma cabe 4
quentinhas de isopor) de forma que facilite nossa entrega, já que entregamos em
outros campus e andares da UERJ. Em seguida levamos tudo para o carro e
partimos para a faculdade. Atualmente estamos chegando em torno de 12h, subimos
para o quinto andar (andar do curso de engenharia) e fazemos a maioria de
nossas entregas, ou retiradas, por lá.
O processo todo,
desde a elaboração até a entrega aos clientes, envolve também o meu amigo de
infância e seu sócio, que são os responsáveis pela cozinha, um cozinheiro e
duas ajudantes que montam as quentinhas.
4- Qual sua visão de médio prazo para o ForaFome, e se tiver, qual seria
sua visão de longo prazo?
Hoje, na nossa
quarta semana de trabalho, temos uma venda aproximada de 250 quentinhas
semanais, sendo uns dias mais fracos e uns dias bem fortes. Nossa meta em médio
prazo é vender aproximadamente 200 unidades diárias, ou melhor, 1000 refeições
por semana. Mantendo sempre a qualidade do serviço e da comida, é claro!
Pensando num prazo
mais longo, nossa visão ainda é um pouco embaçada. Não existe um objetivo claro
definido. Porém, por que não expandir para outras universidades?! Ou
diversificar o produto atendendo a quem tem necessidades diferenciadas, como
por exemplo, vegetarianos, veganos e pessoas fitness?! Talvez um projeto social
que reaproveite as quentinhas excedentes que teriam o lixo como destino ou quem
sabe até produzir uma quantidade maior exatamente para serem doadas a quem
passa por necessidades.
Enfim, as ideias
são muitas e não param de borbulhar na cabeça. Mas como em qualquer caminhada,
devemos olhar para o horizonte, porém, dando um passo de cada vez.
5- Qual o perfil da sua clientela? Poderia me dizer, também, qual o
nível de satisfação dos seus clientes, e qual a quantidade em média atendida
diariamente?
Pelo pequeno tempo
vigente do ForaFome, não foi possível ainda construir uma amostra que defina o
perfil dos nossos clientes. Num primeiro momento, pensamos que seriam pessoas
que costumam utilizar o bandeijão e quando o horário aperta e/ou o dinheiro
sobra, optam pela quentinha. Num segundo instante, pensamos que nossos clientes
seriam pessoas que não possuem o hábito de ‘bandeijar’ e então optam pelas
quentinhas por ser de fácil acesso e boa qualidade. Quem sabe o ForaFome não
está atingindo a ambos os públicos dentre outros?!
Quanto à satisfação
dos clientes, podemos afirmar com propriedade que gira em torno de no mínimo
90%. O feedback tem sido quase sempre positivo e quando as críticas aparecem
são ouvidas e levadas para a cozinha no intuito de serem solucionadas.
Já as quantidades
diárias/semanais já foram respondidas na pergunta anterior.
6- Se lhe fosse incumbida a função de fornecer almoço e janta para todos
os estudantes que são atendidos pelo bandejão, o que você iria fazer? Qual
seria sua proposta? Você assumiria tamanha responsabilidade?
Nosso primeiro
passo numa situação dessas seria entrar em contato com o fornecedor e seu sócio
para saber a opinião deles em relação a tamanha demanda. Posteriormente, em
caso de decisão positiva, procurar por um serviço de consultoria na área para
aprender qual seria a melhor forma de expandir corretamente o negócio.
Particularmente, eu
e Max, ficaríamos bastante honrados em poder executar um serviço que
consideramos de suma importância num nível UERJ como um todo, que seria o
fornecimento de refeições para milhares de alunos por dia.
Certamente
assumiríamos tamanha responsabilidade! Porém, apenas se tivéssemos certeza que
a gente iria conseguir cumpri-lo com a mesma qualidade que servimos hoje em
dia.
7- Por fim, deixe o recado de ambos sobre o que vocês acreditam que
poderia ser feito para melhorar a Universidade? Desde a questão do acesso à
alimentação, principalmente dos alunos em fragilidade alimentar, como também,
para toda a comunidade que acessa a UERJ.
A UERJ é como uma
pessoa que respira por aparelhos, num hospital público e com instrumentos que
datam a segunda grande guerra. Ainda assim já superou os poucos meses de vida
previstos pelo médico e tem tudo para bater os 3 dígitos de idade com muita
garra e perseverança.
É assim que vemos
nossa amada universidade, do povo, para o povo, sobreviver.
Aos que pensam que
ela não tem seu valor, que tal ser a segunda melhor faculdade do estado do RJ
segundo o RUF (Ranking Universitário Folha)?! Se esse resultado foi alcançado
com tamanho sucateamento, imaginem só o que aconteceria se, por um acaso do
destino, houvesse investimento aqui.
Os fatores que
permitiram e levaram a UERJ chegar nesse ponto são inúmeros, desde falta de
repasse de verba pública a má administração interna. Como tudo na vida é uma
questão de prioridades, certamente a UERJ não é uma no momento para estes
responsáveis.
Em relação à
alimentação, a ideia do restaurante universitário (RU) é muito bacana,
principalmente no que diz respeito aos valores cobrados para os alunos (3 reais
para alunos não cotistas e 2 reais para alunos cotistas). Porém, peca em
diversos outros pontos, como a qualidade da comida (que tem sido motivo de
reclamação por diversas pessoas), o tempo de fila (que costuma ser de UMA hora
ou mais em determinados picos) dentre outro fatores que muitos de nós, alunos,
não tem acesso, principalmente da forma como é feito o contrato com a empresa
ganhadora da licitação, repasse de verba e por aí vai.
Se um aluno não tem
tempo disponível para fazer sua refeição no RU, suas opções se estendem aos
restaurantes que tem dentro e fora da UERJ, os quais possuem preços de almoço
compatíveis com o mercado, o que atende a uma grande demanda UERJiana, mas não
aos mais carentes. Estes ficam totalmente dependentes do bandeijão ou de trazer
comida de casa.
Uma solução
alternativa seria a reitoria propor políticas de incentivo ao barateamento de
refeições (principalmente para alunos carentes) em dias e horários de pico,
tanto para os restaurantes já presentes dentro da faculdade como pra possíveis
outros fornecedores (como nós) que possam via a parecer.
ps. Com relação à foto acima, eu pedi para que enviassem uma foto melhor, não tendo outra, vai essa mesmo.
Segue a reflexão sobre como deveríamos propor políticas públicas visando os objetivos básicos de alocação, redistribuição e estabilidade.
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