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PIB Monitorado: os sinais da recessão estavam lá

Dizendo que o mercado tem uma visão de curto prazo, e visa exclusivamente o lucro. Logo, por esse pensamento, empresas que demandam grandes investimentos iniciais, e que demorariam a se tornarem rentáveis, não são atrativas para o mercado. Sendo assim, o Estado necessita intervir.

Eu discordo dessa argumentação, bastando olhar o comportamento do valor de mercado de empresas como Facebook e Google. Empresas estas que passaram a ter lucro muito tempo depois de serem valorizadas e atingirem patamares bilionários. Logo, o mercado não pode ser tão míope assim, de só enxergar no curto prazo.

A falácia nesse argumento do curto-prazismo é simples. Não é o mercado que é míope, são as políticas gerenciais que o são. O mercado é apenas uma média das opiniões gerais sobre as políticas implementadas, e essa média de opiniões se reflete no preço e na tendência. Se a política for boa, o preço sobe, se for ruim, o preço cai, e ponto.

Políticas boas são aquelas que, em geral, elevam a produtividade da empresa, de um setor, ou mesmo, de uma economia como um todo. O mesmo raciocínio vale para políticas ruins. E por produtividade se entende fazer mais com menos, ou mais com a mesma coisa. Implicando que, pelo mesmo homem hora a economia produz mais. Logo, o valor da hora desse indivíduo se torna mais valorizada, o que eleva seu salário - em média.

Analisando, então, o comportamento do que eu chamo de PIB monitorado, pois, o papel da bolsa de valores é fomentar investimentos em negócios, sem a necessidade de uma contrapartida de endividamento. Nesse caso, o financiamento dos investimentos ocorrem via aumento do patrimônio líquido da empresa, a partir da participação de terceiros (investidores) que muitas das vezes não conhecem sequer o nome do gestor ou presidente da empresa. Contudo, em teoria, deverão conhecer bem os balancetes das empresas, e seu nível de governança e transparência, de forma a ter credulidade e confiança no retorno dos investimentos desprendidos pela empresa a ser financiada via compra de suas ações na bolsa.

Sendo assim, a contrapartida para o dinheiro depositado pela compra de uma ação é uma promessa futura de recebimento de dividendos - parte dos lucros que serão repassados aos acionistas, conforme convencionado em assembléia. Logo, os acionistas poderão renegociar essas ações conforme suas expectativas de recebimentos de dividendos futuros. Se as empresas lucram, é sinal de que houve receita suficiente para cobrir os custos operacionais, tributários e financeiros. E mais, se esse lucro tende a ser acima do mercado, é sinal de que existe aumento de produtividade na empresa, o que proporciona a capacidade de produzir mais com menos.

Esse aumento, pode ser vislumbrado na escalada de preços das empresas. Por isso, é importante para entender como estão as empresas que formam grande parte da economia, avaliar o comportamento do índice de preços do mercado. Se esse índice cai, é sinal que as empresas como um todo estão sofrendo perda de produtividade e se tornando cada vez menos atrativas para os investidores. E mais, sem essa forma de financiamento, as empresas perdem uma importante fonte de promoção de novos investimentos, o que gera no futuro menos produção e, portanto, retração econômica.

Analisando, então, o comportamento dos índices de mercado mais amplos da economia americana (SP500) e da economia brasileira (IBOV), pode-se perceber que, mesmo em escalas de longo prazo, de 1980 à 2015, a crise vivida hoje pela economia brasileira é perceptível.




Analisando o comportamento desde a década de 80, de fato existe um crescimento econômico, e é notória a escalada de valor de mercado dos índices, mesmo descontada a inflação. Contudo, a queda dos últimos 5 anos é notória ao longo desse período. O Brasil se recuperou melhor da crise internacional de 2009, contudo, a queda após 2010 é vertiginosa, e o nível de mercado passou o vale da crise em 2009. Ou seja, na prática, mesmo em um ótica de longo prazo (35 anos), a crise é grave.




Em uma ótica de 20 anos, percebemos que a queda nesse período é maior ainda, estamos quase perdendo o que foi conseguido nos últimos anos.





Nos últimos 15 anos, o gráfico é praticamente um U invertido. Sem a menor perspectiva de inflexão dessa tendência.





Nos últimos 5 anos a diferença entre os dois mercados é que, um sobe e o outro desce praticamente na mesma velocidade. Ou seja, estamos perdendo produtividade na mesma proporção que os EUA ganham. Se compararmos o nível de capital em um e outro país, essa diferença poderá gerar um colapso na economia brasileira em breve, e essa tendência pode ser constatada na medida que o real se depreciou em relação ao dólar em mais de 100% no período.



Para finalizar, nos últimos 10 meses, o Brasil desce uma escada que, em escala, significou a perda de mais de 30% no valor de mercado, apreçado em reais. Perda esta que não advém de uma crise internacional ou de um comportamento abrupto do mercado. Essa descida é constante e suave, porém vem se acelerando no último mês - enquanto que nos EUA, o último mês significou uma perda de 10% de valor de mercado de suas empresas (valorado em $).



A conclusão é uma só, corrigida pela inflação, mas apreçados em suas moedas correntes, as economias de 1980 à 2010 andaram juntas. E nos últimos 5 anos inflexionaram seu comportamento. Os sinais da crise e da falta de credibilidade da atual política econômica eram claros, mesmo no longo prazo. Porém, parafraseando Camões o velho do restelo não foi ouvido.

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